cárcere privado

.

parto com minha insólita bagagem:

você que preciso enterrar

a passagem só de ida

me desvencilhando deste fardo

não precisarei voltar

abro a cortina dos dias

depois de tanto tempo

presa a sua loucura

foragida de mim

difícil distinguir

o que é fato do que é medo

ainda assim me esforço

estilhaço o espelho que nos assemelha

 me desenlaço desenredo desinvento

e recomeço

acerca do tempo ou quase

FAZ TANTO TEMPO.JPG

quase um ano – é muito pouco pode ser demais nem se dar conta que passou durar uma eternidade um nada.

quase – pode anteceder o vir a ser mera desculpa não se revelar estar sempre a ponto de nunca chegar.

lugares para os quais você volta – anos depois – tira o sapato abre a janela reconhece o cheiro da terra a permanência das árvores tudo exatamente como se tivesse saído por instantes.

pessoas que você deixa de ver por um ano e quando encontra é um abismo outras com quem retoma assuntos do mesmo ponto e as raras com quem longas conversas se fiam em silêncio no longe de não ver ou tocar.

quase um ano – pode ser toda uma vida ou uma lembrança que falseia lá no fundo de um baú de fotos notícias ilusões pode ser um barco enveredando por outros mares uma grande mala a espera de um trem uma outra vida.

um ano pode mover o mundo colocar pontos finais abrir caixas de pandora quebrar espelhos ou simplesmente um novo calendário pregado na parede branca dos dias.

romance

longe e tão perto

jogos de memória

e de espelho

dias entrando noites

abraços misturando sonhos

fechar os olhos

e por instantes chegar

em seguida saber

o ponto equidistante

em nós

abrir os olhos

virar a página

presentepassado

foto antiga

.

folheio álbuns fotos cartões postais

catalogando:

guardar queimar esconder

e um monte fica sobrando

para um outro olhar

.

invento histórias

para os coadjuvantes

interrogo aqueles que reconheço

e me detenho especialmente

naquela que fui

.

pergunto sem meias palavras

o que dela em mim permanece

enquanto avalio disfarçadamente

o que dela perdi na poeira do tempo

somo divido multiplico

tudo é contundente e inconcluso

.

e no silêncio da noite

volto as fotos preservadas em segredo

caminho por aquele passado

do qual não posso me desfazer

nem decifrar

o espelho através de alice

 

Qual o nosso verdadeiro tamanho?

Alice me sussurra não saber

Quando o mundo parece engolir nosso corpo

Haverá um cogumelo a me fazer crescer?

Se a realidade se traveste em sonho

E se no sonho sinto o beliscar

Como saber se durmo?

Como fazer para acordar?

Mal caminhei e me sinto cansada

Se não sei para onde estou indo,

E o relógio me julga a todo tempo atrasada

Qualquer lugar já me parece um bom destino

E só me importa o chegar…´

É uma menina que habita meu corpo que envelhece

Ontem tomei um chá de certeza

E ele amanheceu turvo em cima da mesa

Acho que estou louca: acontece.

Minha mente vem digerir minha sede por novidade

A minha cabeça está posta a prêmio

Até eu resolver a grande charada:

Afinal, quem sou eu?

A resposta brinca de gato e rato

O rato está atrás do gato

e eu nem sei por onde começar

(Quanto mais eu procuro, mais ela se esconde de mim)

“Comece pelo começo, siga até o fim, e então pare”