mutações

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os tigres que iam nos atacar

tornam-se amigos que chegam de longe

e mansos rebanhos de carneiros

desapareceram atrás das montanhas

há muito muito tempo

não esqueça de comprar uma nova agenda

by in-dissoluvel (tumblr)

reabrirei a agenda depois de 25 dias.

incrível, não fez a menor falta neste hiato pacífico e restaurador.

uso duas a cada um destes  últimos mais de vinte anos.

uma para assuntos do trabalho/sobrevivência que procuro cumprir à risca.

outra pras coisas de que gosto e que me incendeiam.

esta cumpre um papel maior: apazígua demônios, dá polimento à alma.

mais de quarenta agendas …

por quanto tempo alimentariam uma fogueira ?

por algumas horas se transmutariam em luz e algum calor

e ao fim poucas cinzas aguardariam um leve vento

para se dispersarem por completo.

.

vida subnutrida essa.

em alguma estação

by in-dissoluvel (tumblr)

by in-dissoluvel (tumblr)

em um lugar improvável

tenho o dia inteiro vazio

e me debruço sobre ele

sobrevoo árvores flores

bebo orvalho sorrisos

e aproveito para conversar

com um pássaro muito distraído

que não percebe que sou gente

.

de algum remoto firmamento

as estrelas caem

e fazem pedidos por nós

em um certo lugar distante

estou sempre mesmo sem estar

vou e volto a todo instante

conto dias horas de voo

sonhos recuperados de antigas enchentes

.

em imprecisos momentos

me detenho e pergunto ao tempo

se um dia terei sossego

ele já nem responde

cansado de minhas incongruências

sabe que fio desfio

e recomeço em outro tear

vê embora não compreenda

quantos caminhos trilhei

e o trabalho que deu

apagar tantas pistas

.

mas não é missão do tempo entender

ele só tem que passar

como um velho e persistente trem

que devagar segue seus trilhos

e quem quiser que vá com ele

 

saudade

image by in-dissolúvel (tumblr)

queria dizer o que as palavras não exprimem

.

talvez uma sinfonia consiga
desde que interpretada por uma orquestra ímpar
composta de músicos, pássaros e ilusionistas
.
mesmo longe afago seus cabelos macios
faz parte dos meus dedos, mãos, braços
percorrer-te ainda que não possa te ver
.
somos todos isso e aquilo
somos ondas, vagas, altas
ou ainda só espumas
.
em nossas veias correm sangue e  poesia
(e isso faz de nós seres a parte
colecionadores de pausas,
defensores do ar, do mar, do céu que nos respira
e viajantes repletos de sonhos e vazios)
.
divago
vago
voo
sentindo
pensando
em ti

fabulando

“Jetta” by Seamus Conley

Somos feitos de inúmeras teias
terras, afetos e abandonos
a infância é fábrica de sonhos
lendas e fabulações
a adolescência é descoberta
insensatez, queda livre e busca
de códigos que esclareçam o mundo
mapas para inserir-se nele

O tempo – esse espanto –
vai nos mostrando
a metamorfose que somos
o terreno sempre movediço
a cronologia dos sonhos
as ruínas dos planos

E o sentido de tudo ?

Tudo é sempre viagem

Voz e silêncios

Ouço vozes distantes

De tão longe não posso ver

Mas ouço, por um canal de vento

Há uma explicação para isso

Que desconheço, mas o som chega

Houve um tempo em que tentava descobrir

Para além de cada carreira do cafezal

De cada moita de bambu

Os donos das vozes

Mais tarde passei a me concentrar

Unicamente nas vozes

Tentando captar os diálogos

Ouvi conversas fúteis

Juras de morte, intrigas

Nada disso me interessou

Hoje olho a imensidão

Não decifro palavras no vento

Sei que toda gente sonha, sofre, sorri

Só, mergulho no vasto do existir

Sem explicações, sem filosofias

As perguntas (inumeráveis), calo

Fico a escutar o ar, o tempo

A observar distâncias

Paisagens, poemas.

movediço

Não somos iguais

Sequer parecidos

Onde nos vemos hoje

Já nos vimos outro dia

 

Cada um ensimesmando:

Onde foi que nos plugamos ?

Os dois procurando:

Onde foi que nos perdemos ?

 

Não somos parecidos, nem poderíamos

não me pareço com quem fui ontem

talvez você seja quem diz, mas desconfio

que o caminho que trilhamos é movediço

 

As vitórias, aos poucos, viram troféus

sobre os armários, diplomas emoldurados

grudamo-nos nas paredes

passado, passado, passado

 

Não somos bons nem maus

erramos aqui e ali, muito ou quase

tentamos um final feliz, bem sei

mas não fomos competentes nisso

 

Racionalizamos tudo

a felicidade, fica para onde ?

dá para pagar com cartão ?

fomos iludidos ou somos ilusão  ?

 

Olho a tarde, única certeza

algumas coisas tardam

outras nem chegam

e tudo, um dia, passa.

Asas do tempo

Soletro o que não entendo
Na vaga esperança de enfim saber
Rastreio pensamentos
E caio numa espiral sem fim

Enquanto entardece
Me impaciento com o silêncio inabitual
Com o tempo que de repente me sobra
E não sei como preencher

Tenho corrido muito
Perdido horas em engarrafamentos
E marcado tudo em minha agenda eletrônica
Ultimamente utilizo despertador até para dormir

Não vejo a tarde cair em mim
Não pisco, não suspiro, fecho os olhos
Não questiono toda a vã caminhada
E finjo não ver as asas caídas dos meus desejos.