Colón – a praça
um pombo caminha
junto a minha sombra
quase sobre mim
como se eu não …
.
paro
se levantasse os braços
e ele não me notasse?
saberia que …
nada de testes
.
aguardo uma retratação
uma exposição de fotos
uma expedição longínqua
para algum território
ou vazio
.
são muitas setas planos motivos
aguardo a última chamada
talvez vá
talvez voe
caminhos
algo de bom
feche os olhos
nesta varanda
as flores não vão
te deixar morrer
.
ouça o barulho do mar
entoe uma cantiga
conclua aquele pensamento
fugidio
.
confie
rasgue a carta de adeus
a bula do remédio chamado certo
.
relaxe
algo de bom
vai acontecer
.
repare no broto de girassol
em instantes
a casca da semente
vai se romper
.
os seres invisíveis
estão aqui
feche os olhos
para vê-los
.
as flores sorriem
porque você veio
por você
cansaço
eu queria fazer coisas com sentido, não, coisas que quebrassem o sentido
ditado pelo que já é posto, pelas forças cotidianas que nos fazem fingir
como se isso fosse o melhor de nós, queria matar um a um os meus medos
deletar passados, mostrar meus seios, abrir o peito e dizer sim ou dizer não
se fosse pra frear um trem descarrilhado, parar o tempo um dia antes
de um acidente rodoviário ou vascular, desfazer armadilhas, desatar
queria meu pensamento não tão disperso, intermitente, incontrolável
não me dividisse em dez, em mil, cada uma um olhar, um paradeiro
é difícil viver num planeta de espelhos por todos os lados
que não me repetem a mesma, não, ao contrário, me denunciam múltipla
diversa e ainda assim confinada a essa pele corpo roupagem
preferia não ter ido ao céu pois ele me deu a dimensão do inferno
se tivesse morado na Bolívia, não teria flertado tanto com o inimigo
batido tantas vezes na porta errada, assaltado noites frias
mas o tempo é isso, nada e tudo, um tambor de revolver
eventualmente vazio, potencialmente um tiro, um lugar escuro
está bem, não foi um bom dia, não queria, juro, incomodar ninguém
com essa minha poesia vômito, feita de sertões e dilúvios
verso que se desdobra, confessa e logo em seguida desdiz
passado, futuro, pretérito, conjugações numa língua difícil
onde cada verbo é um mundo ou mero sentido dúbio para uma noite mal dormida
deixe estar

by desenharts (tumblr)
Não desperte o pequeno pássaro
que ele não sabe ainda voar
e pouco entende de predadores
convém deixá-lo assim
na doce ilusão de não ser
.
Apenas cuide para não deixar rastros
que possam servir como pista
para estranhos se aproximarem
e machucá-lo por curiosidade ou carinho
.
Talvez seja melhor mesmo nem voltar
deixe-o quieto frágil indefeso
entregue ao fluxo
das marés do destino
fronteiras
fiz um livro chamado fronteiras, levei-o comigo a muitos lugares
na tentativa de delimitar, ou melhor, deslimitar meu mundo
deixei-o entre espanha e portugal no exato ponto em que me disseram
aqui é um, ali é outro país, embora não tenha notado qualquer diferença
outro está perdido entre mato grosso e bolívia
onde pode parecer que é só um fim de mundo e não dois
em outras fronteiras neste mesmo Brasil ou longe dele,
e, os que não deixei, queria ter deixado (e por isso lá estão)
e continuo espalhando-os por aí
e dentro de mim, indefinidamente.
em alguma estação

by in-dissoluvel (tumblr)
em um lugar improvável
tenho o dia inteiro vazio
e me debruço sobre ele
sobrevoo árvores flores
bebo orvalho sorrisos
e aproveito para conversar
com um pássaro muito distraído
que não percebe que sou gente
.
de algum remoto firmamento
as estrelas caem
e fazem pedidos por nós
em um certo lugar distante
estou sempre mesmo sem estar
vou e volto a todo instante
conto dias horas de voo
sonhos recuperados de antigas enchentes
.
em imprecisos momentos
me detenho e pergunto ao tempo
se um dia terei sossego
ele já nem responde
cansado de minhas incongruências
sabe que fio desfio
e recomeço em outro tear
vê embora não compreenda
quantos caminhos trilhei
e o trabalho que deu
apagar tantas pistas
.
mas não é missão do tempo entender
ele só tem que passar
como um velho e persistente trem
que devagar segue seus trilhos
e quem quiser que vá com ele
caminhos de ferro (vania)
Até onde vai a dor ?
Até onde chega o medo ?
E quando chega vem sozinho
Ou traz consigo o terror ?
Até onde vai o cisne
Se o lago é circular e sem saída ?
Até onde voce iria por uma causa,
uma certeza, um amor ?
Para que tantas interrogacões
Se a dúvida é a mola que nos move
Se a noite é o berço do verso
E os dias quase sempre um tédio ?
Onde fica tudo isto
quando tudo acaba ?
No vagão do ontem
Ou na estação do amanhã ?
